
Reconhecimento celebra cultura viva, biodiversidade e resistência comunitária em uma das praias mais simbólicas de Florianópolis, abrindo caminho para o fortalecimento do ecoturismo, da educação ambiental e da proteção das ondas
Em uma cerimônia marcada por emoção, união e o reconhecimento de quase uma década
de mobilização para titulação como Reserva de Surf, no último domingo as comunidades do Moçambique e da Barra da Lagoa se reuniram para celebrar a titulação nacional.
Há cerca de uma década, a comunidade da Praia do Moçambique vinha se candidatando para receber o título que, até o ano passado, era concedido apenas pela organização californiana Save The Waves Coalition – cujo Programa Mundial de Reservas de Surf já havia reconhecido a Praia da Guarda do Embaú como 9° Reserva Mundial de Surf.
Com o lançamento do Programa Brasileiro de Reservas de Surf, o esforço e a importância do notório pico do leste da ilha de Santa Catarina foram reconhecidos, e as Praias do Moçambique e Barra da Lagoa agora se juntam a Itamambuca e Praia do Francês como as primeiras Reservas Nacionais de Surf (RNS).
O evento de Celebração reuniu cerca de 400 pessoas incluindo representantes da comunidade local, instituições públicas e organizações socioambientais, além de surfistas, pescadores, quilombolas, educadores, guardiões da cultura tradicional e defensores do meio ambiente, contando com a presença também de artistas engajados como Moriel Costa, Valdir Agostinho, Marzo Couto e a banda Cultivo.
Personalidades internacionais do surfe e da conservação, como o surfista Tom Carol e o criador do Programa Australiano de Reservas de Surf, Andrew Short, enviaram vídeos comemorando a conquista.
A titulação da RNS do Moçambique representa uma vitória coletiva em defesa do território, das ondas e das histórias que moldam uma das regiões mais simbólicas da Ilha de Santa Catarina. O processo de reconhecimento considerou a profunda riqueza sociocultural do bairro Rio Vermelho e entorno, onde convivem tradições da pesca artesanal, manifestações culturais como as benzedeiras e bruxas, lendas locais e a presença viva dos povos quilombolas. Soma-se a isso a forte cultura do surf e dos esportes de natureza — do surf de ondas grandes ao handsurf —, expressões que conectam o modo de vida local à potência das ondas do Moçambique.
O evento celebrou não só a onda, mas a consciência ecológica de uma sociedade organizada, que resiste frente às ameaças ambientais: a destruição das matas ciliares do Rio Vermelho, a expansão desordenada, o avanço de espécies exóticas e a falta de saneamento básico. A RNS do Moçambique pretende ser instrumento de visibilidade e fortalecimento das ações de conservação da Mata Atlântica, restingas, manguezais e espécies ameaçadas como o lagartinho-da-praia, os bugios e as baleias.

Oficina de Planejamento da RNS Moçambique / Foto: Cadu Fagundes @artenaturalimagens
Na esfera econômica, o reconhecimento da RNS abre novas perspectivas para o desenvolvimento do ecoturismo, do turismo de base comunitária e de iniciativas de geração de renda a partir do artesanato, da pesca sustentável, do surf, da produção audiovisual e de eventos integrados à cultura local. A comunidade expressou a urgência de políticas públicas que incentivem projetos socioambientais, qualificação profissional e estrutura adequada para eventos, turismo consciente e segurança — demandas fundamentais para garantir o equilíbrio entre conservação e desenvolvimento.
Durante os eventos destacou-se a importância de enfrentar questões estruturais como a falta de senso de pertencimento e o distanciamento do poder público em relação à realidade local. A titulação foi celebrada como um marco de reconhecimento, mas também como ponto de partida para a construção de um futuro onde a biodiversidade, a cultura e a comunidade caminham juntas.
Foto em destaque: Roda de surfistas em celebração à titulação / Cadu Fagundes @artenaturalimagens